segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Casamento na Polícia... vixe!


Este caso é verídico, aconteceu comigo quando trabalhava na Delegacia, e, por isso, os nomes das pessoas e dos lugares são fictícios, para preservar a privacidade dos pobres coitados.
Estava eu, tranqüila na minha salinha de registro de BO, tão confortavelmente instalada naquela decoração harmoniosa com o ambiente policial que me cercava quando, de repente, entra um monte de gente lá dentro.
Foi uma confusão danada, mais de dez pessoas se acotovelando numa salinha de 2 x 2, e, o pior, todos falando ao mesmo tempo, sem me dar chance de perguntar o que estava acontecendo. Foi aí que eu resolvi fazer valer o lugar que eu ocupava e deu um grito só: _ Cala a boca todo mundo agora !!!
Todos se calaram e olharam para mim perplexos, pois, ao que parecia, nem tinham notado a minha presença no local. Foi quando um senhor, daqueles típicos roceiros, tirou o chapéu em sinal de respeito e se aproximou de mim perguntando se podia falar comigo. Eu disse que podia desde que falasse apenas uma pessoa de cada vez. Todos concordaram e ficaram quietos enquanto o senhor que havia tirado o chapéu se aproximou de mim, notei que ele estava de terno. “_Sá qui é dotôra, é essa menina ali ó, minha fia”- o matuto disse apontando para uma adolescente que deveria ter uns quinze anos e tinha um ar arrogante que só vendo- “_ela não respeita mais eu nem minha muié, né mesmo Maria?"- olhando para a esposa que abaixou a cabeça concordando com ele, pedindo a palavra e se aproximando.
Eu pensei em explicar que era apenas estudante de direito, e, que não era doutora, mas a confusão tava tão grande que eu achei melhor ouvir o que eles tinham pra contar e depois, se fosse o caso, encaminhar ao local pertinente.
Mas, voltando ao cenário, a senhorinha se aproximou humildemente da minha mesa, com seu melhor vestido, e disse: “_ óia só dotôra, nóis é lá do Brejo Seco, sabe onde fica?”- balancei a cabeça afirmativamente para abreviar a situação e ela continuou- “somo gente direita e meu marido é um omi trabalhador por dimais, mais essa menina ficou da pá virada deis que conheceu o namoradu”- disse apontando para um jovenzinho que não devia ter mais do que quinze anos também- “_ela pula a janela de noite pra si encontrar com ele, dá má resposta pru pai quandu ele manda faze argum serviço de casa, num tamo aguentano mais dotôra!"
O rapazinho, ao contrário da moça, ficava de cabeça baixa, olhando pra ponta da botina, e, talvez pensando o que seria dele dali por diante. Nisso, um outro casal se aproxima e o homem também tira o chapéu antes de começar a falar. “_óia só dotôra, nóis somo os pais dessi menino e é verdade o que os cumpadi tão dizendo, eis dois só qué sabe di namora dia e noite, ninguém disgruda mais eis, ta difícil porque ele nem qué me ajuda mais nos afazer da roça” – nisso a senhora que estava do lado dele começa a chorar compulsivamente e ele continua – “num adianta chorar agora Eufrázia, eu concordei com o cumpadi João quando a gente teve aquela prosa onti e agora num tem mais jeito".
Eu estava totalmente perdida no meio daquela situação e sem entender o que estava acontecendo, então, resolvi perguntar: "_ o que exatamente vocês desejam de mim?"
De repente, a moça, arrogante como sempre, e o rapazinho, olhando para o bico da botina, foram colocados diante da minha mesa, seus pais se posicionaram aos seus lados e os demais permaneceram em pé atrás deles. O pai da moça, “cumpadi João”, se aproximou da minha mesa e disse solenemente: “_Óia dotôra, eu e meu cumpadi Zé, pai desse rapazinho aí, tivemo uma prosa onti e decidimo que já que eis num disgruda um do outro, é melhor que case di uma veiz antes que aconteça o pior, se é que a senhora me entende. Nóis já aproveito e trouxe os vizinho pra sê as testimunha do casório que a gente já resorve o pobrema aqui mesmo".
Fiquei parada e sem palavras para o que estava acontecendo na minha frente: os “noivos”, que não tinham nem quinze anos, de braços dados, os pais da “noiva”, enfurecidos, do lado dela, os pais do “noivo” do lado dele, enquanto a mãe se desmanchava de tanto chorar e o pai tinha uma atitude resignada diante de tudo. Os “padrinhos” de pé atrás dos “noivos” estavam com suas melhores roupas para a ocasião. Como é que eu ia explicar que não é assim que funciona? Pensei comigo :”Tô ferrada...”
Mas quem me salvou daquela roubada foi justamente a menina arrogante, a ”noiva”, que deu o grito: “_Não adianta fazer o casamento porque que na hora em que perguntar se eu quero vou dizer NÃO, aí eu quero ver!”
Os pais dela se entreolharam, então o pai me perguntou: “_ dotôra, é verdade que tem uma lei que diz que se a pessoa num quiser num pode obrigar ela a casá?”
Sem pestanejar eu respondi:”_ é verdade sim senhor, se ela diz que não, não tem casamento, infelizmente eu não vou poder fazer nada por vocês.” Ufa... Nessa hora eu ouvi as risadinhas abafadas dos meus colegas que estavam no corredor do lado de fora.
Os “padrinhos” foram saindo da sala frustrados e reclamando porque estavam perdendo dia de serviço, enquanto a mãe do “noivo” chorou mais ainda enquanto abraçava e beijava o filho, como quem diz “Tá livre coitado”. Quando os pais da “noiva” iam saindo com ela eu chamei:”_ei, esperem um minuto, quero conversar com vocês três.”
Os três voltaram ressabiados, a menina com aquele nariz e pé, que Deus me livre. Fechei a porta para me certificar que ninguém ia ouvir e disse com voz firme e enérgica enquanto apontava o dedo para o rosto da menina:”_escuta aqui mocinha, você mora com os seus pais, come e dorme porque eles te sustentam e o mínimo que você deve a eles é obediência. Desta vez eu te livrei de casar, mas se seus pais voltarem aqui pra reclamar novamente do seu comportamento, aí eu não vou querer nem saber, não vou livrar sua cara...”
A menina abaixou a cabeça e começou a chorar, e jurou que não ia desobedecer mais aos pais porque ela não queria casar ainda, enquanto os pais olhavam para mim agradecidos, levantaram e foram embora com a filha.
Nunca mais eu tive reclamação de que ela estava desobedecendo aos pais...

terça-feira, 12 de outubro de 2010

Paciência...

Sabem aquela brincadeira que as pessoas fazem dizendo “que quando Deus distribuiu ‘tal coisa’ acabou na vez de fulano”? Então, quando chegou a minha vez acabou a paciência, aliás, acho que já tinha acabado há muito tempo porque não sobrou nem um pouquinho pra mim. Sou extremamente impaciente com tudo e com todos, principalmente quando se trata de perguntas tolas, daquelas óbvias mesmo.
O problema é que junto com a intolerância, ou impaciência, veio a impulsividade e aí é que a coisa desanda de vez. Falo e faço coisas sem pensar. Não é minha culpa, sério, é mais forte do que eu. Quando eu assusto, pronto, já foi. É uma má resposta aqui, um tapa na cara ali, enfim, a minha lista de arrependimentos por coisas que eu disse, ou fiz, é enorme.
Mas nada como o tempo passar e a maturidade chegar para nos mostrar que a vida não é bem como a gente pensa. Com o tempo, fui aprendendo que nem sempre dá certo falar, ou fazer, o que vem na cabeça, pois, tudo tem uma conseqüência, e, no mundo adulto o preço pode ser alto demais, inclusive uma hipertensão que me pegou. Sem contar que passei a analisar o tempo da minha vida que perdi discutindo tantas bobagens, simplesmente para provar que eu estava certa no final.
Então passei a desenvolver técnicas para passar pelas situações estressantes sem sair no prejuízo. Resolvi que não é tão importante perder meu precioso tempo só para provar que estou certa sobre um assunto que nem vai mudar o destino da humanidade. Resolvi também que não vale à pena ter certas reações desastrosas que possam queimar o meu filme depois.
A técnica que mais vem dando certo é a da abstração. É bem simples: quando me vejo no meio de uma situação “daquelas” que eu sei que vou acabar falando, ou fazendo, o que não devo eu me teletransporto para um lugar bem legal e fico só de corpo presente, aí, no final, simplesmente concordo com a pessoa que estava discutindo comigo, pronto.
Como é interessante ver a cara de surpresa da outra parte quando percebe que não vai haver discussão, chega a ser hilário, pois, não era essa a reação que as pessoas estavam acostumadas a ver em mim.
Por favor, não confundam as coisas. Isso não quer dizer que passei a fazer pouco caso da opinião alheia, não mesmo. Respeito todos os pontos de vista que me são fundamentados, nem precisa ser um assunto sério demais, pode ser qualquer bobagem do dia a dia.
Também não pensem que virei um “pastel” de vez. Se é um assunto que eu domino, e, que seja importante, eu exponho o meu ponto de vista e a fundamentação de que estou certa, aí, se a outra parte teimar em brigar, “viajo na maionese” até ela cansar e no final balanço a cabeça.
A versão “Andréa paz e amor” (não resisti ao trocadilho) me trouxe muitos ganhos na qualidade de vida, menos ansiedade, menos inimizades e menos temeridade por parte dos outros. Como dizia meu professor de Direito Administrativo, “não é bom que as pessoas tenham medo da gente porque quem tem medo, conspira”!

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Meu momento


As pessoas que me conhecem a pouco tempo acham muito estranho que uma mulher solteira, livre, desimpedida e (quase) independente goste de passar horas no sofá lendo um livro enquanto o mundo gira tão rápido lá fora.
Não fui sempre assim, já gostei de acompanhar o movimento frenético da vida, e muito. Não perdia uma festa, show, balada, qualquer coisa que juntasse gente e fizesse barulho, mas, depois, acabou. Em parte, acho que o fato de eu ter trabalhado numa delegacia de polícia contribuiu um pouco pra isso porque eu passei a conhecer algumas figurinhas não muito bem vindas no meu dia a dia, e, as reconhecia em meio à multidão de qualquer festa. Mas, também veio o fato de que certas diversões perderam a graça para mim. De repente, ficar no meio de uma multidão barulhenta passou a ser algo tedioso e irritante pra mim.
Então cheguei à conclusão que não fazia sentido ficar em meio a um monte de pessoas se empurrando e acotovelando se aquilo não tinha mais a menor graça pra mim. O problema é que as pessoas não entendem e acham um absurdo: “como é que você prefere ficar em casa enquanto o Sucupira “tá” bombando hoje a noite?”, ou “você não gosta de Cavalgada, como assim?”. Às vezes eu me sinto um ET por não gostar de ir aonde todos vão, ou, não gostar do que todos gostam.
O fato é que quando pego um bom livro pra ler eu me transporto para dentro das páginas e me sinto em meio àquela narrativa, imaginando cada personagem e cada lugar descrito. Se for um filme, que eu gosto muito também, analiso a personalidade dos personagens, a atuação de quem os representa, os cenários, a continuidade, fico tensa, tentando descobrir o que há por trás da trama... Isso tudo pra mim é tão divertido quanto os programas acima citados pelos meu conhecidos que me acham estranha. E assim gosto de passar minhas horas de folga, meus finais de semana, feriados, etc.
Costumo dizer aos meus colegas de trabalho que o fim de semana perfeito pra mim é aquele que eu entro em casa na sexta-feira depois do expediente e só saio novamente na segunda-feira cedo para voltar ao batente.
É claro que eu não virei uma eremita, um bicho-do-mato que não admite contato com a civilização... também não é assim gente!
Eu gosto de um churrasquinho de “porta de cozinha”, daqueles que vai uma meia dúzia de conhecidos e ficam como se estivessem em casa, sem frescura nenhuma. Se tiver um violão na roda então, aí é que esqueço da vida. Gosto também de ir ao bar do Joãozinho com meu filho, ou algum amigo (só três pessoas têm este título para mim), ficar conversando fiado enquanto devoramos uma montanha de carne com batata frita... adoro. Como vocês podem ver, abro minhas exceções se valer à pena. 
Outro dia estive conversando com uma amiga, no bar do Joãozinho, e ela me disse o que define minha vida atualmente: estou vivendo um momento muito EU. Aliás, o que me tem feito muito bem.