terça-feira, 4 de janeiro de 2011

Reconciliação

Nos meus dezoito anos de serviço público eu já fiz de tudo: dei aula pra criança, dei aula pra adolescente e pra marmanjo, aí, “por castigo ideológico” fui atender telefone na porta da Delegacia de Polícia, o que me levou a ser Escrivã nomeada pelo Delegado, que me incentivou a cursar a faculdade de Direito... ufa!
Há dois anos fui surpreendida com o convite para coordenar uma equipe na Administração Municipal, o que me deixou assustada, mas, ao mesmo tempo empolgada porque era a minha chance de “sair do castigo” e de trabalhar na área em que me empenhei tanto, o Direito, afinal de contas foram cinco anos ali no banco da faculdade, três meses de estudo para passar na famigerada prova da OAB!
Mas, liderar implica em tomar decisões, que, por muitas vezes envolvem o destino das pessoas. Tudo segue uma hierarquia: você recebe uma ordem superior e tem que fazer funcionar em sua equipe, porque o que se busca na Administração Pública é o bem coletivo, e, é nisso que eu acredito.
Eis que um belo dia chegou a mim uma ordem superior de remanejar duas pessoas, e, eu teria que escolher entre três. Aliás, não era bem assim, porque eu tinha duas opções no mesmo horário, mas, apenas uma no outro horário, que, por sua vez, já tinha um emprego em outro turno. O que me deixou menos tensa é que eu não mandaria ninguém embora, seria apenas um remanejamento, ou seja, ninguém perderia o emprego nem seus direitos inerentes. Mas a coisa não foi encarada dessa forma, o bicho pegou literalmente !
Conversei com as duas meninas do turno em que eu poderia escolher e expliquei a situação, dizendo que teria que remanejar uma pessoa de cada turno e infelizmente eu teria que escolher entre as duas. Foi uma choradeira geral. A equipe era composta de sete mulheres, então vocês imaginam o drama da situação quando eu conversei com essas duas, que eu adoro de coração. Depois de muitas lágrimas e abraços a decisão foi tomada baseada num fator neutro escolhido por mim e continuamos todas amigas.
O problema foi com a pessoa do outro turno, que não haveria escolha por ser a única. No dia seguinte à reunião em que remanejei uma das meninas eu não iria ao trabalho por causa de um exame que exigia preparo. Então, supliquei ao pessoal da equipe que não dissesse nada para ela para que eu conversasse sobre o assunto e explicasse tudo pessoalmente. Foi o mesmo que dizer: “contem tudo, e, distorcido”.
Estava em casa fazendo o tal preparo para o exame quando o meu telefone toca. Era de lá. Me avisaram que “alguém” contou a história totalmente distorcida, colocando o fato como pessoal e a menina foi parar lá na minha equipe superior, de onde veio a ordem, reclamando de perseguição. Não demorou cinco minutos para o meu telefone tocar novamente e a minha equipe superior me questionar o fato, dizendo que havia uma pessoa lá se queixando de perseguição.
Foi um custo explicar o que aconteceu na realidade e que foi uma fofoca bem das maldosas que criou a situação, pois, eu supliquei à minha equipe que não contasse nada, pois eu conversaria pessoalmente sobre o remanejamento dela, que não era opcional, uma vez que ela já exercia atividade remunerada em outro turno. Mas, graças a Deus, meus superiores entenderam a situação e me apoiaram.
O grande problema é que foi criada uma mágoa muito grande e eu ganhei uma inimiga. Ela passou a me virar o rosto na rua. Mas nada como o tempo para curar as feridas e os mal entendidos.
Eu estava fazendo uma audiência quando o Juiz me perguntou se eu me importava de uma estagiária assistir porque ela teria que cumprir uma carga horária, e, a estagiária era ela. Fiz questão de dizer que eu não me importava porque já estive naquela situação.
Um ano se passou, eu estava com meu filho no bar do “Joãozinho” quando ela passou e acenou para alguém que estava lá dentro, e, eu, por impulso, acenei de volta pra ela, que, para minha surpresa, sorriu.
Exatamente um dia antes do recesso de natal deste ano eu estava afogada em minha papelada quando, de repente, a filha dela, menina linda e alto astral, entrou saltitando na minha sala. Eu levei um susto porque até então a menina estava proibida de falar comigo. A menina, com seu jeito alegre e espontâneo me deu um embrulho e disse:”minha mãe mandou pra você”. Acho que a menina notou que eu estava chocada e disse: “abre pra ver o que é”.
Quando eu abri, me deparei com o livro “Ágape”(Pe. Marcelo Rossi). Não sei descrever o que senti naquele momento, principalmente quando abri o prefácio e li a primeira linha: “Ágape é amor incondicional, o amor generoso, o amor sem limites; puro, livre!”. Me levantei e dei um abraço apertado e demorado na menina, dizendo :”fale com sua mãe que eu adorei”. No mesmo dia mandei recadinho pela internet perguntando: ”amigas de novo?” e ela respondeu: “Claro!”
Quem me conhece sabe que não tenho religião oficial, tiro o que há de bom em cada doutrina e levo pra minha vida. Mas, ganhar este livro de presente teve um significado muito especial pra mim, estou lendo e vou guardar com muito carinho, pois, teve um significado muito importante na minha vida: RECONCILIAÇÃO !
Não soube, e nem quero saber, quem foi o autor da maledicência que causou nossa inimizade, mas Deus nos reaproximou, e, é isso que importa agora. Não vou ilustrar este texto com fotos porque eu não pedi permissão, mas quero que ela saiba que ainda vamos nos encontrar pessoalmente para nos darmos um abraço bem demorado e fraterno.

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