Minha vida profissional, digamos assim, começou cedo: aos 15 anos trabalhei como balconista de uma lanchonete, limpando, fritando salgados, atendendo clientes, ah, tudo isso ao mesmo tempo. Mas aí, meus pais acharam muito pesado porque eu estava ainda no primeiro ano do ensino médio, então, procurei outro, e, depois de trabalhar numa ótica (do meu tio), fui parar numa fábrica de produtos de cimento e por fim numa pré-escola, aí já estava no terceiro ano.
A tal da "escolinha" era a coisa mais linda e fofa... no início! Passado alguns dias, eu chegava em casa como se estivesse vindo de uma guerra: era o dia inteiro de correria, cocô, xixi, vômito, tinta guache sendo arremessada, massinha sendo comida, cabelo sendo puxado, e, lindas mamães no fim do dia questionando porque a roupa do filho estava suja. Bastava. Não era isso que eu queria pra mim!
Eu sabia do que gostava: pessoas e esportes. Então começaram as oportunidades de trabalhar com crianças maiores e adolescentes. Aí sim, era muito bom. Com meus dezenove anos já dava aulas na rede pública municipal e tinha alunos bem maiores, e mais velhos, do que eu, e, quando tinha porteiro novo na escola ele me barrava achando que eu era aluna chegando atrasada... adoooro lembrar disso !
Também encontrei meu espaço na dança, que lecionei com muito amor: dança de salão (a febre do forró foi demais), dança afro (adoro a representação dos elementos da natureza), e, teve também a moda da aerodance (mistura de ginástica e dança). Era uma delícia ficar o dia inteiro ensinando dança para crianças e adolescentes de uma comunidade que realmente me ensinou a ser gente de verdade com amor ao próximo, solidariedade, cooperação, mutirão de limpeza e construção (era um barato). Não chegava a considerar uma obrigação, de tão prazeroso que era passar até doze horas por dia no meio de tanta energia boa!
Paralelamente a tudo isso eu fazia arbitragem. Sim, apitava jogos de basquete e futsal, além de ser apontadora (mesária) nos outros esportes especializados. Fiz cursos da federação e era da Liga de Futebol da cidade. Com muito orgulho, fui a primeira mulher a fazer parte, eu me achava o máximo por isso. Foram muitas viagens para trabalhar em torneios e campeonatos. Passei muito aperto correndo de jogadores nervosos, mas, quem tá na chuva é pra se molhar, faz parte!
Mas a vida, às vezes, vai tomando rumos inesperados, e, de repente, me vi, talvez por retaliação ideológica, trabalhando dentro de uma delegacia de polícia. Nunca vou me esquecer da cara do delegado olhando para o meu currículo (totalmente voltado para área de esportes) e se perguntando "o que faria comigo ali". Primeiro, já que não tinha nenhuma experiência em trabalho administrativo, a tão temida portaria, que era o castigo mais detestado por todos que passavam por ali: atender telefone, atender público, receber BOs que chegavam a toda hora... ufa, uma loucura! Depois, com o interesse e a experiência, veio a nomeação para escrivã, e, em meio a tantos inquéritos, e a administração carcerária, documentos que envolviam a vida e o destino de pessoas, veio o interesse pelo Direito.
Foram cinco sofridos anos de faculdade após um longos dias de trabalho, às vezes sem ter tempo de comer ou tomar banho, deixando meu filho, ainda pequeno, em casa. Muitas vezes ele pedia que eu não fosse para a aula. Os sábados e domingos eram dedicados para trabalhos e estudos, além da minhas obrigações normais de casa, então tive que abandonar a arbitragem, com grande pesar. Mas quando olho para o meu diploma e minha carteira da ordem, sinto que valeu a pena.
Enfim, a oportunidade para trabalhar no tão sonhado Direito. Deixei para trás amigos, que nunca vou esquecer, afinal foram oito anos de delegacia, mas eu tinha que ir atrás do meu sonho. E veio da melhor maneira possível: atuando na assistência jurídica de pessoas carentes financeiramente, o que me deu oportunidade de aprender o que realmente era o Direito na prática, e, de crescer muito como ser humano vivenciando aquelas situações tão peculiares. Nunca um caso era igual ao outro.
Mas a roda da vida continuou a girar e vim parar em outro ramo da minha profissão: as relações de consumo. Tudo diferente de novo. Os pedidos são para "ontem", pessoas chegam nervosas, estressadas porque já chegaram no seu limite de tolerância e não conseguiram uma solução, então, os "superpoderosos" da equipe tem que resolver na mesma hora, senão "_vou na imprensa e nos seus superiores..." Sem contar que qualquer notícia relacionada que a mídia divulga num dia, no dia seguinte chove gente querendo que eu já saiba tudo de pronto. A cada dia um novo desafio a vencer, é disso que eu gosto!
O importante é que continuo trabalhando com pessoas, mesmo que seja de maneira bem diferente de quando comecei lá pela adolescência, pois, se antes trabalhava o corpo, agora trabalho com vidas, destinos, solução de problemas. É pena que o esporte tenha se reduzido a uma esporádica caminhada quando o cansaço deixa, e, à torcida pelo meu filho que agora é atleta.
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